Copenhague me engoliu!

Copenhague não me deixou entrar, mas desta vez eu estava lá, no salão frio da capital dinamarquesa de onde foi anunciado o Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Eu estava na vibração do presidente Lula, nas lágrimas do Rei Pelé, no sorriso do governador Sérgio Cabral, nas palavras do ministro baiano Orlando Silva, no olhar de Paulo Coelho, na alegria estampada de todos os integrantes da delegação brasileira que trabalhou durante dois anos para materializar o sonho de poder ver, pela primeira vez na América do Sul, a competição esportiva mais importante do planeta. Desta vez Copenhague teve que me engolir. Entrei sorrateiramente na cidade das loiras e saí vitorioso. Ganhei de Chicago, Tóquio, Madri, e me senti de alma lavada. Que orgulho Brasil. Valeu ter esperado tanto tempo para dar esse grito de felicidade. Agora são eles, os dinamarqueses, que terão que vir em mutirão para a terra de todas as raças e cores ver a cadência da morena e ouvir cantar o sabiá. Quando aqui chegarem, a recepção será estilo cinco estrelas, com direito a água de coco e feijoada carioca para fortalecer o físico e não vacilar nas disputas de quadras e campos. Nossa gente vai jogar mais duro ainda, a partir de agora, para preparar o salão nobre do país, o inconfundível Rio de Janeiro. Vai dá samba e alegria na competição.
No final dos anos 70 residia temporariamente na gélida Hamburgo, cravada no norte da Alemanha, quando resolvi aproveitar uma folga para conhecer a charmosa Copenhague. Acompanhado de um músico amigo, e com 300 dólares no bolso – grana suficiente para as pretensões de um fim de semana -, peguei um trem de primeiro mundo com destino ao prazer. Infelizmente, ao chegarmos à capital nórdica, não nos deixaram entrar, apesar de mostrarmos o passaporte verde e amarelo e o desejo de tocar e cantar um repertório brasileiro para espantar o tédio dinamarquês. Na estação, a polícia da fronteira alegou ausência de quantia suficiente nos nossos bolsos. Imediatamente foi providenciado o nosso retorno ao ponto de partida, a estação ferroviária de Hamburgo. As poucas horas que passamos entre os olhares dos policiais dinamarqueses, retidos no aguardo de uma solução para o impasse, foram suficientemente preenchidas com pragas e palavrões contra aquela atitude insana de receber visitantes sem a mínima consideração. Questão de educação e um ensaio para uma Europa que aprendeu a se fechar aos imigrantes indesejáveis do terceiro mundo.
Mas hoje a realidade é outra. Já não somos nem terceiro mundo, nem quarto imundo. Somos uma nação em desenvolvimento e de economia forte, que caminha com altivez rumo ao seleto grupo dos países prósperos. Ainda pecamos, e muito, na Educação – o vazamento das provas do Enem é um exemplo – na Saúde e na divisão da riqueza nacional, mas vencemos preconceitos, construímos importantes etapas democráticas e ganhamos confiança para seguir em frente. Que venham os dinamarqueses, franceses, irlandeses, portugueses, enfim, todos eles. Vamos mostrar pro mundo que somos bons em receber visitas e merecemos respeito. E se duvidarem, aqui ficará uma boa parte das medalhas que serão penduradas no peito dos atletas que terão a satisfação de competir sob a bênção do Cristo Redentor.